Na última terça-feira (27/10), cerca de 200 lideranças Marubo, Mayuruna, Matís, Kanamary e Kulina, representados pela União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), estiveram na cidade de Atalaia do Norte para protestar contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215/2000. No mesmo dia a Comissão Especial da Câmara que discute a proposta no Congresso Nacional aprovou o relatório de Osmar Serraglio (PMDB-PR) com 21 votos favoráveis, todos de deputados ruralistas.
Os manifestantes saíram em passeata pelas ruas de Atalaia do Norte carregando a faixa “PEC 215 NÃO!” e pedindo respeito aos direitos dos povos indígenas garantidos pela atual Constituição. “Somos contra a PEC 215 porque sabemos que vai afetar todas as terras indígenas, mesmo as já demarcadas. Sem a terra não somos nada, sem a terra a vida dos índios não existe”, diz Paulo Marubo, coordenador da Univaja.
Manifestantes indígenas ocupam as ruas de Atalaia do norte contra a PEC 215 (Foto: Victor Gil/Acervo CTI)
Para os indígenas, a PEC 215 não afeta somente as demarcações, mas também a decisão sobre o que pode ser feito em terras indígenas, já que afeta o direito sobre a exclusividade na exploração de seus territórios. A Terra Indígena Vale do Javari, por exemplo, é área de interesse de petrolíferas e os indígenas temem as atividades dessas empresas. “A PEC 215 vai afetar os territórios indígenas, vão explorar a madeira, vão explorar o petróleo. Na exploração, esse óleo vai pros igarapés, vai chegar nos rios e o peixe vai morrer”, opina Todah Kanamari, presidente da Associação do Povo Kanamari do Vale do Javari (Akavaja).
As lideranças alegam ainda que não estão sendo ouvidas quanto às políticas que afetam seus direitos. “Nosso medicamento está na mata, essa é nossa cultura. Sem consulta não podemos deixar que explorem nossas terras. Os políticos de Brasília precisam respeitar nosso povo também”, comenta Waki, liderança do povo Matsés que também é contra a PEC 215.
A Univaja divulgou, em documento assinado por lideranças de todos os povos representados pela organização, sua posição de repúdio à PEC 215. Na Câmara de Vereadores de Atalaia do Norte, o vereador indígena Manoel Barbosa da Silva, do povo Marubo, colheu assinaturas de seus colegas em uma moção de apoio à manifestação dos povos indígenas do Vale do Javari contra a proposta da bancada ruralista do Congresso Nacional.
Manifestantes indígenas ocupam as ruas de Atalaia do norte contra a PEC 215 (Foto: Victor Gil/Acervo CTI)
Comissão Especial da Câmara aprova relatório da PEC 215
Apesar do forte rechaço do movimento indígena, também na terça-feira a Comissão Especial da Câmara que discute a proposta no Congresso Nacional aprovou o relatório de Osmar Serraglio (PMDB-PR). O relatório foi aprovado com 21 votos favoráveis, todos de deputados ruralistas. Os parlamentares aliados dos povos indígenas se retiraram do plenário da votação. Em seguida foram apreciados dez destaques, todos rejeitados, mantendo o texto do relator.
A PEC 215/2000 transfere do Executivo para o Congresso a atribuição de reconhecer Terras Indígenas, Unidades de Conservação e Territórios Remanescentes Quilombolas. Na prática, ela deve paralisar pelo menos 228 demarcações de Terras Indígenas e é considerada inconstitucional por juristas. Além disso, abre a possibilidade do Congresso revisar territórios já demarcados. Nos últimos anos a proposta se tornou alvo de protestos do movimento indígena nacional.