As organizações e grupos abaixo assinados, em apoio aos povos indígenas do Brasil, manifestam repúdio à minuta de “Proposta de regulamentação da demarcação de terras indígenas” que, somada a outras medidas de retrocessos de direitos constitucionais em diversas áreas sociais, estão sendo impostas pelo atual governo à sociedade brasileira à revelia da lei, de maneira atropelada, autoritária e ilegítima.
Sem qualquer diálogo com o Conselho Nacional de Política Indigenista – CNPI, nem consulta prévia aos povos indígenas, a minuta de decreto, que veio à público pela imprensa no dia 12.12.2016, contraria a legislação vigente e a jurisprudência e impossibilita a resolução dos conflitos atuais, pelos motivos que seguem:
- Desrespeita a Constituição Federal Brasileira de 1988 ao ignorar o direito originário que os povos indígenas detêm sobre suas terras e recursos naturais, ou seja, direito que antecede à constituição do Estado brasileiro, além de tratar direitos fundamentais como objeto de negociação, desconfigurando a noção de usufruto exclusivo e o caráter imprescritível do direito indígena sobre suas terras.
- Desrespeita o direito à consulta livre, prévia e informada, garantida pela Convenção 169/OIT ao preparar um Decreto de extremo impacto sobre os povos indígenas, não apenas sem consultá-los, no apagar das luzes de um ano difícil como o de 2016, numa clara manifestação de má-fé.
- Atenta contra direitos constituídos dos povos indígenas, ao reabrir para revisão atos demarcatórios já consolidados, promovendo conflitos em áreas já pacificadas, ao submeter todas as terras indígenas ainda não registradas em cartório ou SPU a novo período de contestação por quaisquer “interessados”.
- Viola os princípios de razoabilidade e eficiência da administração pública ao submeter todos os processos de demarcação em curso à estaca zero, independente da fase em que se encontrem, para cumprir novas regras sobre o processo demarcatório, criadas para dar espaço a decisões políticas sem respaldo técnico.
- Distorce os termos da Declaração da ONU sobre o direito à reparação em casos de inconstitucional remoção dos povos indígenas de suas terras tradicionais, ao abrir a possibilidade de substituição da efetivação do direito à terra por indenização em dinheiro e ao legitimar e oficializar crimes de esbulho territorial cometidos no passado recente contra as populações indígenas.
- Institui tratamento ainda mais desigual aos povos indígenas perante a Justiça, ao introduzir como regra geral todas as condicionantes definidas especificamente para o julgamento da PET 3388, e aplicar “manifestações individuais de Ministros do STF” para restringir direitos, como se fossem súmulas vinculantes.
- Normatiza a inconstitucional aplicação da tese do Marco Temporal para legitimar situações de esbulhos de terras indígenas, posses ilegítimas, irregulares e ilegais e, consequentemente, outras violações de direitos humanos dos povos indígenas.
- Transforma a Funai em órgão assistencialista, ao retirar seu papel de órgão de defesa dos direitos indígenas, colocando-a no papel de instância de legitimação de violações de direitos territoriais ou, quando muito, que contabilizaria danos materiais a serem indenizados.
- Atende aos interesses de setores que pressionam pela aniquilação da existência dos povos indígenas enquanto povos autônomos e culturalmente diferenciados, ao criar instâncias revisoras no Ministério da Justiça e Cidadania que tendem a reforçar o poder de barganha política sobre os direitos indígenas ultrapassando suas competências legais.
- Contraria recomendações ao Brasil da Relatora da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, bem como recente Resolução do Parlamento Europeu sobre o tema, agravando violações de todos os direitos humanos dos povos indígenas já indicadas nestes documentos.
Pelos motivos expostos, entendemos que a minuta de Decreto revela o propósito do atual governo, no sentido de enterrar as políticas de demarcação de terras indígenas, de regularização fundiária, de reforma agrária e ordenamento territorial do país.
Sem legitimidade ou justificativa para criar novos procedimentos de demarcação, a proposta minutada não oferece soluções para os conflitos existentes, cria novos entraves e aprofunda as violações e violências contra os povos indígenas no país. Parece querer voltar no tempo das inaceitáveis políticas de confinamento territorial e de assimilação cultural, que podem levar ao extermínio sociocultural ou etnocídio dos povos indígenas.
Enfim, trata-se de gravíssima situação de retrocessos no campo dos direitos humanos e dos direitos constitucionais, onde o Estado democrático de Direito é mais uma vez colocado à prova.
Esperamos que a referida proposta seja definitivamente arquivada e que sejam tomadas iniciativas a fim de que se cumpram os direitos fundamentais dos povos indígenas às suas terras tradicionais conforme determina a nossa Carta Magna, demais legislação em vigor e os princípios internacionais de direitos humanos.
Conjuntamente e em apoio a Mobilizacao Nacional Indigena/APIB, https://mobilizacaonacionalindigena.wordpress.com/, assinam:
Amazônia Real Jornalismo Independente |
Articulação de Mulheres Brasileiras -AMB |
Articulação dos Empregados Rurais do Estado de Minas Gerais/ADERE-MG |
Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil |
Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil |
Associação Brasileira de Antropologia |
Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais/ABONG |
Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais – AATR |
Associação de Defesa do Meio Ambiente de Araucária – PR/AMAR |
Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida/Apremavi |
Associação de Proteção ao Meio Ambiente de Cianorte – PR/APROMAC |
Associação de Saúde Ambiental – PR/TOXISPHERA |
Associação dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre – AMAAIC |
Associação Floresta Protegida |
Associação Juízes para a Democracia – AJD |
Associação Mulheres pela Paz |
Associação Nacional de Direitos Humanos – Pesquisa e Pós-Graduação – ANDHEP |
Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente/ANCED |
Blog Combate Racismo Ambiental |
Central Única dos Trabalhadores – CUT Brasil |
Centro de Assessoria Multiprofissional/CAMP |
Centro de Cultura Linguagens e Tecnologias Aplicadas da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – CECULT/UFRB |
Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva – CEDEFES |
Centro de Documentación en Derechos Humanos “Segundo Montes Mozo S.J.” (CSMM)/ Quito, Ecuador |
Centro de Estudos Bíblicos/CEBI |
Centro de Pesquisa e Extensão em Direito Socioambiental – CEPEDIS/ PUC PR |
Centro de Pesquisa em Etnologia Indígena – CPEI/Unicamp |
Centro de Trabalho Indigenista – CTI
Coordenadoria Ecumênica de Serviço – CESE |
Coletivo de Mulheres Transamazônica e Xingu |
Coletivo ENTITLE (Rede Europeia de Ecologia Política) |
Coletivo Purus |
Coletivo Terra Vermelha |
Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos |
Comissão Guarani Yvyrupa – CGY |
Comissão Pró-Índio de São Paulo – CPI-SP |
Comissão Pró-Índio do Acre |
Comité Permanente por la Defensa de los Derechos Humanos (CDH) / Guayaquil, Ecuador |
Conectas Direitos Humanos |
Conselho Indigenista Missionário/CIMI |
Conselho Nacional das Populações Tradicionais/CNS |
Conselho Pastoral dos Pescadores /CPP |
Cooperativa Kayapó de Produtos da Floresta – CooBaY |
Cosmopolíticas – Núcleo de Antropologia/Universidade Federal Fluminense |
Departamento de Antropologia da Universidade Federal do Paraná |
Divisão de Educação Indígena/SEED – RR – Boa Vista – Roraima |
Dom da Terra AfroLGBT |
ELO Ligação e Organização |
FASE |
Federação das Organizações e Comunidades Indígenas do Médio Purus /FOCIMP |
Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro – FOIRN |
FIAN Brasil |
Fórum Paranaense de Religiões de Matrizes Africanas – FPRMA |
Greenpeace Brasil |
Grupo Carta de Belém |
Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais – GESTA-UFMG |
Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais – GESTA-UFMG |
Grupo de Estudos sobre a Diversidade da Agricultura Familiar – UFPA |
Grupo de Estudos: Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente da Universidade Federal do Maranhão (GEDMMA/UFMA) |
Grupo de Pesquisa em Antropologia Jurídica do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Santa Catarina/GPAJU/UFSC |
Grupo de Pesquisa Sociedade, Ambiente e Ação Pública – UFPA |
Grupo de Trabalho sobre Ecologia Política do Conselho Latino Americano de Ciências Sociais – CLACSO |
Grupo Moitará de Pesquisas em Direitos Étnicos -Faculdade de Direito/UnB |
Iepé – Instituto de Pesquisa e Formação Indígena |
Índio É Nós |
Inesc |
Iniciativa das Religiões Unidas/URI/Brasília |
Instituto Autonomia |
Instituto de Assessoria às Comunidades Remanescentes de Quilombos – IACOREQ |
Instituto de Estudos Jurídicos de Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais/Idhes |
Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia – IPAM |
Instituto de Pesquisa, Direitos e Movimentos Sociais |
Instituto Internacional de Educação do Brasil/IEB |
Instituto Madeira Vivo e a Aliança dos Rios da Panamazonia |
Instituto Pólis |
Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul/Pacs |
Instituto Socioambiental – ISA |
Justiça Global |
Laboratório de Estudos e Pesquisas em Movimentos Indígenas, Políticas Indigenistas e Indigenismo – LAEPI-CEPPAC/UnB |
Laboratório de Inovações Ameríndias (lina), PPGAS, Museu Nacional |
Licenciatura Indígena Políticas Educacionais e Desenvolvimento Sustentável do Instituto de Ciências Humanas e Letras/Universidade Federal do Amazonas |
Licenciatura Intercultural Indígena do Sul da Mata Atlântica da UFSC |
Mestrado em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural (MADER)/UNB |
Mestrado Profissional em Desenvolvimento Sustentável, na Área de Concentração em Sustentabilidade junto a Povos e Terras Tradicionais – MESPT/UnB |
Movimento Camponês Popular/ MCP |
Movimento Cultural Arte Manha |
Movimento Cultural de Olho na Justiça |
Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB |
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra/MST |
Movimento Nacional de DIreitos Humanos/ MNDH |
Movimento Negro de Altamira |
Movimento Nossa Belém/Movimento Cidades Sustentáveis/PA |
Movimento pela soberania popular na Mineração – MAM |
Movimento Xingu Vivo Para Sempre |
Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade Federal do Paraná – MAE |
Mutirão Pela Cidadania |
Núcleo Curupiras: Colonialidades e Outras Epistemologias (Pernambuco) |
Núcleo de Antropologia e Saberes Plurais da Universidade Federal de Mato Grosso |
Núcleo de Cultura Indígena – NCI |
Núcleo de Estudos Ameríndios/UFPR |
Núcleo de Estudos sobre Etnicidade – NEPE/UFPE |
Núcleo de Pesquisa e Extensão em Agroecologia da FUP/UnB |
Núcleo de Pesquisa Ekoa: direito, movimentos sociais e natureza da UFPR |
Operação Amazônia Nativa /OPAN |
Organização dos Povos Indígenas Apurinã e Jamamadi de Boca do Acre/OPIAJBAM/AM |
Organização dos Povos Indígenas Apurinã e Jamamadi de Pauini/OPIAJ |
Organização dos Professores Indígenas do Acre – OPIAC |
Pastoral da Juventude do Meio Popular/PJMP-Brasil |
Plataforma DHesca |
Plataforma Interamericana de Derechos Humanos, Democracia y Desarrollo (PIDHDD Regional |
Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional/ UFRJ |
Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social/Universidade Federal de São Carlos |
Programa de Pós-Graduação em Antropologia/ Universidade Federal de Minas Gerais |
Programa de Pós-Graduação em Antropologia/Universidade Federal do Paraná |
Projeto ALICE – Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra |
Promotoras Legais Populares |
Red de Observadores de la Consulta Previa en America Latina – RED OBSERVA |
Rede Brasileira de Justiça Ambiental. |
Rede de Cooperação Amazônica – RCA |
Rede Europeia de Ecologia Política |
Rede Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos/ Regional Minas |
Rede Sul-Americana para as Migrações Ambientais – RESAMA |
Relatoria de Direitos Humanos e Povos Indígenas |
Revista Xapuri |
Terra de Direitos |
Tucum Brasil |
Uma Gota No Oceano |
União de Mulheres de São Paulo |
União dos Povos Indígenas do Vale do Javari – UNIVAJA |